3a Prática Determinação de latitude usando o método de Sterneck
Sabemos que ao passar pelo plano meridiano de um observador, uma estrela culmina, ou seja, atinge um valor extremo de altura. Na culminação superior a estrela cruza o semicírculo meridiano superior do local (semicírculo superior é o que contém o zênite). Neste instante sua altura é máxima, sendo esta uma situação favorável à sua observação.
Outra particularidade interessante da passagem meridiana é que temos nesta situação relações bem simples envolvendo a distância zenital da estrela (que será mínima), sua declinação e a latitude astronômica do local. Consideremos, por exemplo, a figura II.3, na qual mostramos o plano meridiano de um observador a uma latitude < 0°. O pólo elevado para este observador é, portanto, o pólo celeste sul (PSC). Sua altura com relação ao horizonte é em módulo igual à latitude do observador. O pólo celeste é obviamente perpendicular ao equador celeste, que cruza o plano meridiano no ponto EC. A declinação da estrela é indicada na figura, assim como sua distância zenital. É fácil provar que:
Figura II.3 – Diagrama do plano meridiano, mostrando uma culminação a sul do zênite de um observador de latitude < 0°.
z
Seja agora a situação indicada na figura II.4. Agora a estrela culmina a norte do zênite. Neste caso, podemos escrever:
z
Figura II.4 – Diagrama do plano meridiano de um observador de latitude < 0°, com uma estrela culminando a norte do zênite.
Em ambos os casos, se medirmos z e conhecermos a declinação podemos determinar nossa latitude. Note, contudo, que a determinação da distância zenital a partir de uma medida de leitura vertical (LV) obtida com um teodolito exige duas correções: a correção para o erro zenital do teodolito (z0) e a correção para refração (R).
zcorr = LV – z0 + R
onde z0 é obtido fazendo-se leituras verticais de uma mira fixa com o teodolito em posição direta e invertida, enquanto que a correção para refração depende do valor de z e das condições atmosféricas (tabelas com correções para refração podem ser obtidas no Anuário do ON).
Mas podemos combinar as duas equações acima usando duas estrelas: uma culminando a sul do zênite, a uma distância zenital zs e de declinaçãoszs; a outra culminando a norte do zênite a uma distância zenital zn e de declinação nzn.
Somando as duas equações teremos então:
2sn + zs zn →
Este método de usar duas estrelas que culminam em lados opostos do zênite é conhecido como Método de Sterneck ou Método de Horrebow simplificado, pois se baseia no método mais preciso de determinação de latitude originalmente desenvolvido pelo geodesista Horrebow em 1732 e aperfeiçoado pelo capitão de esquadra norte-americano Talcottem 1834. A vantagem do método está no fato de que os erros zenitais (instrumentais) nas medidas de zs e zn são automaticamente cancelados ao tomarmos a diferença acima. Se escolhermos estrelas que culminem a distâncias zenitais aproximadamente iguais, a diferença zs – zn também removerá praticamente todo o efeito devido à refração atmosférica. Portanto, com este método não há necessidade de determinarmos o erro zenital do teodolito e o efeito da refração é minimizado.
Antes da noite de observação, já temos que ter definido(s) o(s) par(es) de Sterneck a serem usados. Além de culminarem em lados opostos do zênite, as estrelas do par devem idealmente satisfazer às seguintes condições:
1) Suas distâncias zenitais na culminação devem ser relativamente pequenas (zs ≤ 45°e zn ≤ 45°) de modo a minimizar correções para refração;
2) A diferença de distância zenital mínima deve ser da ordem de uns 5° ou menos (|zs – zn | ≤ 5°), para garantir que as correções para refração se cancelem ao máximo;
3) O intervalo entre as duas culminações não deve exceder uns 30min (ou seja, |s – n | ≤ 30min), de forma a que a atmosfera não mude muito entre uma observação e outra, novamente como forma de evitar termos de refração que não se cancelem;
4) Na noite de observação, após a montagem e nivelamento do teodolito, efetuam-se as leituras verticais (Lv) e horizontais (Lh) das estrelas do par de Sterneck, em intervalo de tempo que compreenda o instante da passagem meridiana. As tabelas abaixo são um exemplo dos dados coletados.
Exemplo
Tabelas contendo a hora legal e os valores de leitura horizontal e vertical do teodolito para duas estrelas, uma culminando a norte do zênite e a outra ao sul (trabalho do aluno de Engenharia Cartográfica da UFRGS, Rafael Santos Genro).
Ângulos horizontal e vertical coletados durante um intervalo de tempo de 30min prévios e posteriores à culminação da estrela Beta Leonis a norte do zênite:
Medições
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Hora Legal
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Ângulo Horizontal
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Ângulo Vertical
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1
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19h 23min 58s
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126º 25’ 39”
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45º 47’ 19”
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2
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19h 35min 05s
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122º 41’ 27”
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45º 09’ 33”
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3
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19h 45min 30s
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119º 08’ 12”
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45º 01’ 27”
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4
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19h 57min 42s
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114º 56’ 46”
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44º 51’ 36”
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5
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20h 03min 14s
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113º 01’ 15”
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44º 50’ 59”
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6
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20h 09min 56s
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110º 42’ 58”
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44º 53’ 24”
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7
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20h 14min 38s
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109º 05’ 38”
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44º 57’ 01”
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8
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20h 19min 07s
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107º 33’ 54”
|
45º 02’ 04”
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Ângulos horizontal e vertical coletados durante um intervalo de tempo de 30 minutos prévios e posteriores à culminação da estrela Beta Crucis a sul do zênite:
Medições
|
Hora Legal
|
Ângulo Horizontal
|
Ângulo Vertical
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1
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20h 33min 58s
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286º 38’ 52”
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30º 10’ 59”
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2
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20h 39min 19s
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287º 59’ 08”
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30º 03’ 44”
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3
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20h 45min 10s
|
289º 27’ 24”
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29º 57’ 22”
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4
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20h 50min 10s
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290º 43’ 35”
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29º 53’ 51”
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5
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20h 54min 19s
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291º 46’ 59”
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29º 51’ 38”
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6
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20h 58min 35s
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292º 52’ 13”
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29º 50’ 38”
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7
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21h 04min 16s
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294º 19’ 39”
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29º 51’ 00”
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8
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21h 10min 49s
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296º 00’ 06”
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29º 53’ 38”
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9
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21h 17min 09s
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297º 36’ 32”
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29º 58’ 33”
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10
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21h 22min 33s
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298º 58’ 20”
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30º 04’ 32”
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11
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21h 27min 04s
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300º 05’ 24”
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30º 10’ 20”
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Os pontos obtidos podem então ser graficados e ter a eles ajustada uma parábola, de forma semelhante à que foi feita em práticas anteriores. Resulta daí um valor de altura máxima (ou distância zenital mínima), correspondente à culminação, e que pode ser diretamente inserido na equação para a latitude dada acima. Havendo uma diferença considerável entre os instantes das culminações das estrelas do par, aconselha-se a correção dos valores medidos para refração. A figura II.5 mostra um gráfico de hmed = 90° – Lv x Lh para uma das estrelas de um par usado.
Figura II.5 – Gráfico com medidas de altura aparente, 90° – LV, em função de medidas de leitura horizontal. A curva é uma parábola ajustada aos pontos medidos.
Outras referências bibliográficas: Determinações Astronômicas, F. Hatschbach; Geodésica Elementar e Astronomia de Campo, J. Haertel; Notas de Aula de J.M. Arana.
4a Prática
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